Vocês não são do mundo, mas eu os escolhi,
tirando-os do mundo; por isso o mundo os odeia.
João 15.19
A maioria dos eventos vividos no colégio
não é bem nítida. Não nos lembramos, por exemplo, das notas obtidas ou das gincanas
e comemorações festivas. Frequentemente não nos recordamos o nome da garota que
sentava em nossa frente, nem de alguns professores ou do diretor da escola.
Mas, há circunstancias marcantes que não podemos jamais esquecer, como aquele
anoitecer de primavera ficou gravado e esculpido em minha memória... Dele me
recordo com clareza.
Ainda consigo visualizar a cena, estou
sentado no quarto de meus pais. Os assuntos debatidos durante o jantar ecoam
pelo corredor. Temos convidados, mas pedi para sair da mesa. Mamãe fez torta,
sorvetes e bolos, mas abri mão da sobremesa. Nada estava sociável, tudo me era
desagradável, não tinha apetite. Aliás, quem tem tempo para conversa fiada ou
torta e sobremesas em um momento crucial como esse?
Preciso concentrar-me no telefone, não
posso me entreter com outras coisas, posso não ouvi-lo tocar.
Eu esperava o telefonema por toda à tarde.
Ele não veio. Estava convicto de que ouviria o telefone tocar durante o jantar.
Ele não tocou. Agora estou fitando os olhos no telefone como um cachorro com os
olhos fixos em um osso, esperando que o técnico de futebol da escola me diga
que fui escolhido, que estou em algum time do colégio.
Sentado na cama, minha chuteira, meias e
camisa estão ao meu lado. Posso ouvir meus amigos brincando lá fora na rua. Não
me importo. Tudo o que importa é o telefone. Quero que ele toque, espero
desesperadamente, que ele toque.
Mas, ele simplesmente não toca...
Os convidados se vão. Ajudo a lavar a louça
e termino minha lição de casa. Papai me diz alguns elogios, mamãe diz coisas
interessantes tentando distrair minha tensão. Já está quase na hora de ir para
a cama. E o telefone nunca toca. Fica mudo. Um silêncio doloroso, agonizante
para mim.
No grande esquema das coisas, ficar de fora
de um time de futebol pouco importa. Mas garotos de doze anos não podem ainda
entender o grande esquema das coisas e, para eles, fazer parte de um time é
muito importante, e minha mente só pensava no que eu diria quando os
coleguinhas da escola perguntassem que time havia me escolhido...
Todos conhecemos a dor de um telefonema que
não vem.
Alguns de nós já somos veteranos dessa
sensação, o telefone também não tocou para muitos de nós. Em um esquema muito
maior das coisas, ele não tocou. Talvez quando nos candidatamos para o emprego,
no vestibular para ingressar na faculdade, para a vaga de síndico, ou para o clube,
tentamos compensar algo ou obter ajuda... E o telefonema nunca veio. Já estamos familiarizados a dor de um telefonema
que não vem, todos conhecemos bem a dor da frustração por algo que contraria
nossas expectativas, e lança por terra toda nossa esperança.
Forjamos frases compensatórias para
justificar nossa decepção: Ele acabou "pagando o pato". Ela foi
deixada "no altar". Eles foram "ignorados". Foram
"barrados no baile"; ou o mais conhecido: "Ele estava cuidando
das ovelhas", como o rei Davi.
Fato é que, muito tempo depois de minhas
esperanças terem se esvaído e de minha chuteira, meias e camiseta terem
retornado ao armário, a campainha tocou. Era o técnico, que deu a entender que
eu havia sido o primeiro a ser escolhido e ele achou que um assistente já havia
me telefonado. Só depois descobri a verdade. Eu havia sido o último a ser
escolhido. E, não fosse o telefonema de meu pai, certamente eu teria ficado
fora do time. Mas papai telefonou e o técnico apareceu; e eu fiquei feliz em
jogar.
Ainda bem que a Palavra de Deus está
repleta de exemplos que nos garante que nosso Pai Celeste conhece o nosso
coração e, por ser o nosso Criador conhece nossas limitações, e a despeito
delas; Ele tem um lugar reservado para cada um de nós, não corremos o risco de
ficar fora da escalação do Seu Time.
"Vocês não me escolheram, mas eu os
escolhi para irem e darem fruto, fruto que permaneça, a fim de que o Pai lhes
conceda o que pedirem em meu nome" (João 15.16).
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